NUMA BANCA DE REVISTAS UM EXEMPLAR DE TEX TRAZ UM PASSADO FELIZ.

De repente, em uma banca de revistas, o tempo parece não ter passado. Lá está Tex Willer, um dos maiores heróis do farwest americano, embora criado por italianos. A vida retrocede e, ali, no centro da cidade, em 2021, reencontro-me, como em um sonho, com tantos outros cowboys saídos das revistas em quadrinhos e das telas do saudoso Cine Iris. Obrigado Tex, por esse maravilhoso reencontro!

            Hoje, raridade, ontem um interessante entretenimento de valor cultural, embora nem todos pensassem assim, as revistas em quadrinhos, em especial com estórias do faroeste norte-americano e, em segundo plano, as que evocavam os super-heróis, preencheram de sonhos e fantasias gerações que não dispunham da internet e das chamadas ferramentas que facilitam tanto a vida atual, mas, ao mesmo tempo, já não inspiram tantos sonhos e expectativas. Nas bancas de revistas ainda se vê, em algumas delas, timidamente, escondido entre varias outras publicações, o mocinho Tex Willer, que há 73 anos desafia estradas poeirentas, solidão, desconforto  e  perigosos bandidos, na interminável missão de defender inocentes, levando esperança e paz a locais, os mais inóspitos possíveis e desprovidos de lei.

         Para as gerações mais recentes que talvez sequer saibam quem é Tex Willer, ou mesmo jamais viram uma revista em quadrinhos, este é um assunto obsoleto, enfadonho e até mesmo sem razão de estar aqui, neste espaço, que poderia ser ocupado por assuntos pertinentes aos jovens de hoje. De certo modo têm razão, porque a Terra continua girando e os dias não se repetem ao final de 24 horas. Cada dia é um novo dia. Mas se evocamos hoje, o que vivemos ontem, por certo os jovens atuais, farão o mesmo amanhã, lembrando o hoje. Salvo se o amanhã não acontecer!

          Mas o que pretendemos aqui é “mergulhar” nas brumas de várias décadas atrás, quando a vida tinha outro ritmo e a juventude buscava sair de um extremo conservadorismo, no sentido amplo para evoluir. A leitura era, sem dúvida, a chave dadivosa para tal, e o surgimento das revistas em quadrinhos foi, ao lado do cinema, o grande dínamo condutor desse rápido processo de transmudação.

        Mas vale lembrar que o heroico Tex Willer não foi o pioneiro nessa cavalgada. Em relação à saga dos heróis do faroeste (farwest), quem saiu na frente foi Bronc Peeler, criado em 1934 nos Estados Unidos, por Fred Harman.  No ano seguinte aparecia em jornais do mesmo país, as tiras diárias do Rei da Policia Montada (King of the Royal  Mounted) ilustradas por  Alien Dean. Em 1937 a Itália entrava no mercado, publicando os episódios de Kit Carson de autoria de Rino Albertarelli. A partir de 1938 começaram a surgir novos heróis como Red Ryder (versão mais madura de Bronc  Peeler) e  Zorro (The Long Ranger). Na Bélgica surgia Lucky Luke, que tratava o faroeste de forma humorada.

         Assim, histórias e estórias tendo como motivo a conquista de parte do território norte-americano por colonos, apoiados por  valentes cowboys, na luta contra índios, bandidos, desordeiros, fazendeiros desonestos e pistoleiros, ganharam o mundo. No Brasil esses corajosos heróis do oeste, acompanhados de indesejáveis e violentos bandoleiros, chegaram a partir de 1938, através de revistas como Guri, Gibi e Gibi Mensal, precedidas pela publicação de tiras em jornais de super-heróis. Em 1934 o Suplemento Juvenil da revista carioca A Nação, mostrava os primeiros quadrinhos de Flash Gordon e Jim das Selvas. Essas publicações foram transformadas em uma revista autônoma, que na década de 1930, alcançou a expressiva tiragem de 360 mil exemplares por semana!

                Na década de 1950 foi expressivo o número de novos heróis e de publicações, tornando-se intensa a procura por “revistas de faroeste”. Aos domingos a garotada que ia ao extinto Cinema Iris (na Avenida Senhor dos Passos) para a matiné, naturalmente um filme do gênero, formava uma multidão, para vender, comprar e trocar exemplares. Revistas da Editora Brasil América Ltda (EBAL) e Rio Gráfica e Editora (G) eram majoritárias, mas havia também revistas da La Selva, Gráfica Novo Mundo, Editora Record e outras como menor volume de publicações.  Rocky Lane, Cavaleiro  Negro, Roy Rogers, Durango Kid, Flecha Ligeira, Zorro, Gene Autry, Gunsmoke (xerife Matt Dillon), Rifle, Gavião Negro, Mascarado Solitário, Paladino do Oeste,  Monte Hale, Kit Carson, Buck Jones, Jonah Hex, Kid Colt, Giddap Joe, foram alguns dos mais famosos heróis do oeste, mas havia também aqueles que viviam nas selvas como Fantasma , Tarzan e  Jim das Selvas, o mágico Mandrake,  e os donos de superpoderes como  Super-Homem e Batman. Nessa época os adeptos do gênero policial tinham as revistas X-9, Meia Noite, O Detetive e outras que foram surgindo, inspirados na ficção científica, ao lado daquelas reminiscentes do verídico faroeste. Havia os gibis infantis como Tico-Tico, Cirandinha e Tiquinho, mas o “máximo”, como se dizia então era o faroeste.

        Por isso mesmo ao me deparar em uma banca de revistas, com o já vetusto Tex Willer, ainda exibido a boa forma de muitas décadas atrás, vivi um momento de felicidade. Recuei no tempo, senti a Feira de Santana da nossa juventude, da feira-livre, dos babas nos incontáveis campos de futebol, das bancas de revistas, do Cine Iris e muito mais. Enfim outro tempo. O maravilhoso tempo em que, sem telefone celular, sem internet, sem as ferramentas de hoje (naquela época ferramenta era enxada, cavador, pá, facão, martelo, estrovenga…) vivíamos felizes e seguros na companhia de tantos heróis! 

*(Por Zadir Marques Porto)

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