Um feirense em cada lugar

Marcílio Tavares Costa – Jornalista

A primeira vez que estive no Rio de Janeiro foi na lua de mel com Eliana, no final de dezembro de 1986. Depois de uma longa viagem de 24 horas num ônibus – afinal não tinha dinheiro para viajar de avião -, enfim entendemos porque chamam o Rio de Cidade Maravilhosa. Um lugar lindíssimo, praias fantásticas- apesar da água gelada e o mar forte -, bairros encantadores, como os mais antigos como Laranjeiras, onde ficamos durante quase 30 dias, Flamengo e Botafogo. Exploramos tudo de ônibus na maioria das vezes, mas quando era possível a gente aproveitava o metrô, um dos lugares onde o ar condicionado arrefecia o calor e era um refúgio do jovem casal em busca de mais conforto térmico. Com tantos morros, o sol nos castigava, mesmo acostumados com o calor baiano, principalmente na entrada do sertão em Feira de Santana. Quando o tempo esquentava além das medidas, vinham as trovoadas, com chuva forte, ventos, raios e trovões. Era assustador, como no dia que fomos conhecer Petrópolis e vimos o mundo desabar em água. No meio da tarde, o tempo fechou e a gente antecipou o retorno para a rodoviária. Até então não entendemos porque as lojas do comércio começaram a colocar barreiras na porta. Quando a chuva chegou já estávamos à espera do ônibus, mas era tanta água que começou a inundar as cercanias do terminal e ficamos sabendo que por conta do temporal o acesso à serra tinha sido fechado. Ninguém subia, ninguém descia. Com medo, ficamos esperando as coisas acalmarem, o que só aconteceu depois das 8 da noite, quando finalmente pegamos o ônibus de volta para o Rio de Janeiro e só então entendemos porque os comerciantes tinham tentado se proteger. Ao passar pelo centro de Petrópolis vimos funcionários de várias lojas tirando a lama de dentro porque tudo tinha ficado inundado. Quando o calor apertava demais no Rio, muitas vezes a gente procurava abrigo no Shopping Rio Sul, em Botafogo, para aproveitar o ar condicionado e olhar as novidades – naquela época, Feira nem sonhava em ter um shopping e nossa referência na Bahia era o Iguatemi, em Salvador. Mais de três décadas atrás, fazer fotos era uma operação planejada. Com poucas exposições disponíveis, geralmente 12 ou 24 fotos, tinha que escolher com cuidado o que iria fotografar para registrar o essencial e não gastar muito na hora de revelar o filme, afinal naquela época jurássica smartphone não era nem mesmo coisa de ficção científica. Naquele dia, fomos ao shopping mais uma vez atrás de uma temperatura mais agradável e aproveitamos também para revelar fotos. No shopping tinha aquelas lojas de revelação “ultra rápidas” que entregava as fotos reveladas em uma hora, um espanto de avanço tecnológico. Deixamos o nosso filme e fomos bater perna no shopping e comer um delicioso pão de batata que eu e Eliana experimentamos pela primeira vez e ficamos fregueses. De volta para pegar as fotos fomos surpreendidos com a presença de uma jovem nos aguardando. Mas como assim, alguém no Rio de Janeiro nos esperando? Como fomos descobertos? A jovem ao nos ver veio se apresentar e esclarecer o mistério ao casal descoberto em lua de mel em pleno Rio de Janeiro.- Olha, eu também sou de Feira de Santana e quando passei aqui na porta da loja vi a fotos de vocês, então resolvi esperar para falar com os dois – explicou a jovem simpática e desconhecida que nos reconheceu ao ver nossas fotos exibidas durante o processo de revelação. Mesmo não tendo geolocalização, fomos encontrados e mapeados por uma conterrânea que confirmou a tese de que feirense é igual a pardal: tem em todo lugar. Não pense que é brincadeira. Ainda no Rio Sul a gente já tinha visto o então deputado federal Jairo Carneiro e sua mulher, a desembargadora Marama Carneiro, que estavam de passagem pela Cidade Maravilhosa. Isso sem contar que durante a nossa viagem a Petrópolis demos de cara com um ônibus lotado de feirenses, que estavam na cidade em excursão e aproveitaram para fazer compras na rua Tereza, famosa pelas lojas de confecções. Vivi outra experiência muito curiosa em 2019 durante uma viagem a Portugal. Eu e Eliana passamos alguns dias em Porto e depois fomos para Lisboa, onde a gente revezava visitas à capital portuguesa e ida às cidades próximas. Sem que a gente se desse conta, programamos com antecedência uma visita ao santuário de Fátima justamente no dia do meu aniversário, uma grande surpresa que nos deixou muito felizes. Fizemos as primeiras visitas de praxe e quando estávamos nos deslocando para outro ponto vi de longe uma estátua que logo identifiquei ser do papa João Paulo Segundo, que foi baleado pelo turco Ali Ağca no Vaticano justamente no dia 13 de maio de 1981, dia dedicado à virgem de Fátima. Fomos ver o monumento de perto e já me preparava para tirar uma foto de Eliana para depois ela tirar uma minha quando uma mulher se aproximou e se ofereceu para tirar a foto do casal junto. Achei seu rosto conhecido e aceitei a gentileza. Quando me devolveu o celular perguntei se o seu nome era Luiza e se já tinha morado em Feira de Santana. Espantada, ela confirmou as informações e abriu aquele sorriso quando me identifiquei. 40 anos depois, dois ex-colegas do Colégio Estadual de Feira foram se encontraram de uma forma totalmente imprevisível no outro lado do mundo.

*Por Marcílio Tavares Costa – Jornalista.

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